A importância da Trincheira da Resistência como
contraponto à farsa do julgamento da AP470 é o maior fato político recente da
esquerda brasileira.
Tudo começou quando dois militantes da juventude, Pedro
Henrichs e João Paulo de Oliveira Netto, foram para a entrada do Presídio da
Papuda, com duas cadeiras, erva mate, cuia e água para o chimarrão esquentar o
frio das noites brasilienses.
Pedro já havia, com outros militantes, feito jantares
em 2012, quando do julgamento, para arrecadar dinheiro para pagamento das
multas dos companheiros condenados. Os desdobramentos disso falo ao final desse
artigo.
O acampamento começou no sábado logo na chegada dos
nossos companheiros, presos políticos da ditadura do STF, ao Presídio da
Papuda.
Eles ficaram em suas cadeiras de praia, sob um frio
extremo à noite e um calor escaldante de dia. Choveu horrores na segunda
madrugada e chegou Magoo, com uma van, para eles dormirem um pouco e se
protegerem da chuva.
No começo, quando cheguei na segunda-feira à noite, já
éramos 6 residentes, sendo que fui a primeira mulher. Todos os dias,
companheiros vinham de todos os lados.
Aí foram chegando mais companheiros, cada um trazendo uma comida, tenda, colchonetes, colchões. Foram chegando doações de todos os lados e apoio de pessoas de esquerda, filiadas a partido ou não a esse ato de apoio e solidariedade.
A chegada de donativos
A direita, que logo no segundo dia achincalhou os dois
primeiros companheiros, dizendo que era um protesto de dois petistas, viu
estarrecida o Brasil inteiro e muita gente do exterior dando apoio ao grupo da
Trincheira de Resistência e Luta em Solidariedade aos presos políticos que se
tornou um movimento gigante.
Pedro em Quito com a juventude mundial
Nota Pública conjunta de entidades brasileiras em internacionais
Quer dizer, quem nunca dormiu, não precisava
acordar, somente se juntar nesse ato em favor dos direitos humanos na maior
covardia dentro da nossa recente democracia.
A Trincheira remeteu a militância aos tempos em que a
gente era um partido que vivia protestando por dias melhores. A vida dos
Brasileiros melhorou muito, ocorre que por conta disso, nossos companheiros
foram perseguidos diuturnamente pela imprensa, pela oposição e depois pela
justiça que sempre foi motivo de desconfiança do povo brasileiro.
Voltemos à Trincheira. A rede Globo, colocou um
banheiro químico, que para mim foi o maior símbolo de segregação que vi aos
parentes dos apenados e também aos que eles chamam de colegas das outras
emissoras. O banheiro químico tinha em sua porta, colado um papelão escrito:
Rede Globo. Pronto, somente ele poderiam usar.
Nós da trincheira, usávamos o mato, assim como os
parentes dos presos. Logo, como havia eu de mulher residindo lá, companheiros
providenciaram dois banheiros químicos um feminino e um masculino que era usado
por nós e também pela população de família dos apenados, assim como nossa
comida noturna, geralmente um caldo feito por algum companheiro era divido com
eles.
A mídia mostrou meia dúzia de revoltados, mas, não
mostrou a multidão de parentes que iam à nossa tenda todos os dias, vestiam
camisas do partido e com a foto dos companheiros. Trocávamos experiências e
sempre foi uma relação amistosa. Não havia revolta alguma neles, muito pelo
contrário, havia solidariedade.
A trincheira serviu também para discussão do que se
quer para o sistema carcerário brasileiro e também as injustiças cometidas
contra pessoas inocentes que estão tão encarceradas quanto nossos companheiros.
A troca de experiências sobre as a forma como justiça
conduz as execuções penais também deram o tom de nossas conversas com eles.
As famílias de apenados entenderam que se a justiça faz
com pessoas públicas descaradamente o que vem fazendo, imagina com o cidadão
comum.
Então esse ato começado por Pedro e João Paulo, trouxe
à tona a discussão sobre que justiça queremos para o Brasil, isso em nível das
famílias de apenados, no país inteiro e também no exterior.
A importância da Trincheira no cenário político é
minimizada pela mídia comercial, mas, é discutida nas ruas, nas redes, enfim em
todos os lugares por onde passamos.
Com a ida de Genoíno para o hospital, a Trincheira se
mudou para o estacionamento ao lado do STF.
Mais pessoas chegaram e hoje há muitos residentes.
Passam todos os dias pela Trincheira, cerca de 500 pessoas, isso desde a
Papuda.
Nunca houve um protesto contra as arbitrariedades do
STF, muito menos em frente à ele.
A trincheira já sofreu vários ataques físicos da direita raivosa.
Isso é um marco na história política que põe em
discussão todo o Judiciário. E os juízes e promotores para a democracia fazem o
mesmo tipo de discussão proposto pela Trincheira.
Lavagem da Estátua da Justiça
A Trincheira hoje simboliza a discussão da reforma
política, do judiciário e da mídia, enfim, entrou para a história como o centro
onde acontece discussões relevantes para o nosso país.
A Trincheira ousou lutar, ousou resistir e está ousando
vencer os opressores desse país.
Do jantar organizado por Pedro e vários outros
integrantes da juventude que não sei nominar, então se sintam representados por
ele, até a arrecadação histórica de fundos para pagamento das multas absurdas e
abusivas de um julgamento que foi uma farsa do começo ao fim.
O papel da
Trincheira foi decisivo para que tudo isso acontecesse. Pois as pessoas
espontaneamente se solidarizaram com a trincheira e depois com as campanhas de
arrecadação.
O país reconhece a trincheira como porta-voz de todas
as suas lutas, esse fenômeno, dificilmente ocorrerá outra vez.
A todos que vem e vão na Trincheira e os que estão
desde o começo, só temos a agradecer pela garra, luta e resistência.
Abraçaço na Trincheira tendo ao fundo um belo arco-íris
Parlamentares em entrevista na Trincheira - Papuda
Don com Maria Alice
Monica Valente fincando mais uma cruz
Joana Saragoça fincando mais uma cruz